A Língua que me fala
 
 

Explicados da Mãe





Se o pão-de-queijo tá estragado, é que o polvilho já tava derrancado!
O fubá de moinho para as broas, tem de ser sempre peneirado, viu?!
Então não sabe até hoje!? Não compra tomate do pé amarelo que não presta!
Molho de quiabo tem de ficar verdinho, verdinho... Aí, a gente espalha o cheiro verde, a cebola picada em rodelas, põe uma pitada de pimenta do reino e deixa uma pimenta-de-bode bem vermelhinha e inteira para enfeitar e dar cheiro. Mas, ah se o molho amarelar! Joga tudo fora que desse jeito aí, ó, nem cachorro num come!
E volta já com essas tilangas de carne que cê trouxe! Diz pra aquele desgraçado que  num pedi carne pra cachorro não! Se ele insistir, eu vou lá!
Eh filharada mole! Deixam todo mundo da rua cagar na boca deles!
Mulher que anda mais que a égua do Galaço, está procurando coisas...
Eh siô, por que é tá prosa? Hominho, ó, só serve é pra pisar em bosta, levar recado para as putas e arrumar briga pros grandes, viu?! Em homem do cagadô baixo, a gente não deve botar fé!
Mas então ela falou isso!? Pudera, a língua dela é tão grande que dá a volta por trás e enfia no cu!
Na certa isso que tinha de acontecer! Aquela fresca daquela mulher fica lá parada, com aquele beiço de égua na sombra!
Ela tem o rosto assim, encovado, feito uma muchaca velha!

Os trieiros da vida dão muitas voltas... e a barriga num dói uma vez só não!

A gente deve evitar de entrar em tapera onde há muito tempo num mora ninguém pois ali, é um despitismo só de pulgas, piolhos e até percevejos!


Sapinhos de Janeiro

A polifonia dos sapinhos
Me dizia em sonora linguagem
Que as águas tinham chegado...

No alto da cidade, pertinho da estação do trem de ferro,
A rua de terra vermelha, sem fim...
As águas de janeiro, trouxeram os mataréus;
Moitas de carirus, pés de mamona,
Touceiras de capim viçoso alteando os ramos,
Escondendo a base do poste de luz.
Nem parece que na seca,
Aquela baixada onde fica o poste,
Vira um chão duro, pelado de mato.

Juntou água de enxurrada na moita de capim,
E as chuvas não deixam ela secar.
Vieram os sapos... mas de onde?
O córrego da cidade fica longe...
De que jeito chegaram aqui nesses altos?
Será que vieram pulando pelas ruas,
Quando ninguém tava olhando?
Só se for assim...
Agora, nas águas eles ficam ali,
Comem os bichos que volteiam e volteiam perto da luz
Até cair bem lá, na goela dos sapos!

Sonoros, eles cantam assim:
 Long, long, long, long, long...
Essa parte do canto parece que vai longe, longe...
Então, eles meio que tropeçam,
Mudam de voz e soam curto:
  Tong, tong, tong....
E depois, retornam ao canto longo
Que enche rua de uma monotonia sem fim:

  Long, long, long, long, long...

Eu chego devagarinho...
Mas os danados percebem,
Silêncio total! Eu paro...
Eles cantam de novo!
Mais um passo...
E eles param de cantar!
Já tentei chegar perto deles, de todo jeito!
Nada de conseguir ver o sapos cantando...
Só de longe, quando um deles saía do capim.

Aí, as águas vão embora,
O mato seca, acaba o capim.
Cadê os sapos? Como é que eles foram embora dali?
Já sei! Com a seca chegando, esperaram eu ir dormir,
Saíram pulando, pulando até chegar ao brejo!
Mas nas águas vindouras, vou esperar eles,
Quero ver como é que eles vêm lá do brejo
Até cá em cima, perto da estação do trem de ferro!

Agora, mal eles foram embora,
Já estou com saudade do canto deles!
Que gostoso dormir com a distante cantoria dos sapinhos,
Chegando até o meu travesseiro macio!
Vou ter que esperar até janeiro que vem
Para ouvir o canto deles outra vez...

  Long, long, long, long, long,...
  Tong, tong, tong,....
  Long, long, long, long, long....

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